segunda-feira, 22 de abril de 2013

Nascer em Natal: um negócio pra lá de escrachado

Sinceramente eu tenho medo de parir em Natal. A situação do nascimento aqui está pior do que o quadro geral do Brasil, que já é ruim. O ano começou já com proibição de doula e recentemente uma das duas maternidades particulares de Natal lançou seu vídeo de divulgação de 2013. É possível perceber que se trata de uma cesárea eletiva (quando há agendamento prévio sem real motivo) como sendo uma situação normal de nascimento, contrariando o que preconiza a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde (MS). As evidências científicas mostram que cesárea eletiva tem sido associada com maior risco de desfechos maternos graves e maiores complicações para o bebê, principalmente quanto a questão da prematuridade. O Brasil tem um índice muito superior aos 15% estabelecidos pela OMS para o índice de cesarianas. A situação de Natal me parece um tanto horrenda. Eu mesma rodei por cinco obstetras até encontrar um que estivesse disposto a conversar sobre a minha concepção de como eu gostaria que fosse o meu parto. E ainda assim eu passei por uma cesárea desnecessária entre outras situações péssimas durante o nascimento do meu filho. Tive a certeza de que a prática definitivamente não era baseada em evidência científica. A situação obstétrica de Natal tem se mostrado cada vez mais tensa. Profissionais da assistência que se mostram a favor da humanização do parto e questionam condutas de um modelo obstétrico engessado são alvo de chacota e de condutas desrespeitosas por parte do complô da assistência engessada. Os protocolos de atenção ao recém-nascido vão contra o que recomenda OMS e MS. Não há contato pele a pele. Não há incentivo a amamentação, uma vez que já ministram leite artificial assim que o recém-nascido chega no berçário. Quem perde no final das contas são as mulheres e os bebês. Em sua grande maioria estão desinformadas e/ou estão a mercê de um corporativismo que não está disposto a mudar paradigmas. O pré-natal, que era para funcionar como um momento de informação e de troca, funciona mais como uma  pesquisa minuciosa para achar algo que justifique a cesárea (e que geralmente não é uma real razão).
O município conta com uma maternidade pública com instalações favoráveis ao parto humanizado. O problema é que os profissionais não estão capacitados dispostos a acompanhar o parto de forma humanizada. Ver o nascimento como um negócio, prezando pela comodidade de horários agendados e de retorno financeiro ao invés de ver o bem estar da mãe e do bebê são condutas desumanas. 
Pelo que vivi, para parir em Natal de maneira natural, humanizada, para que respeitem os desejos da parturiente, só mesmo parindo em casa longe das armadilhas do pré-natal ou então protegida das armadilhas que são colocadas por obstetras cesaristas. Os profissionais e os hospitais de Natal não estão preparados para essa demanda do parto humanizado. As pessoas que podem mudar essa realidade são as mulheres. Exigindo e lutando por um modo de nascer respeito e com carinho DE VERDADE. Porque pra ser respeitoso, é preciso ter uma conduta horizontal, é preciso acompanhar o parto. Afinal, o parto é da mulher e de quem mais ela quiser que o seja.

Mulheres, o direito é nosso!

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Guest Post: Elucubrações sobre alimentação complementar de uma mãe amante de comida

Perto de Cauã fazer seis meses comecei minha procura por informações e relatos da introdução alimentar. E hoje o post é da querida Soraya Souza, a Sol, mãe da linda Rosa (essa menina de olhos luminosos da foto)! Eu aprendi um bocado com a experiência dela! Olhaí:

O que comer é para você? Para mim, é algo entre uma benção, uma celebração, um honra, uma dádiva, um deleite. Não sei quando ou como isso se deu, sei somente que comer é uma das coisas mais importantes e prazerosas da minha vida. Mas só tive a dimensão disso quando, grávida, comer se tornou uma obrigação regrada: enjoos tão intensos no primeiro trimestre que perdi um bocado de peso e nos meses seguintes uma fome tão descomunal que eu não podia atrasar as refeições em mais que dez minutos, para evitar perigosas quedas de pressão. Some a isso o entendimento da importância de comer bem para o bem-estar global e pronto, estava composto o contexto para uma mãe preocupadíssima com o futuro alimentar da sua cria.
Felizmente, Rosa mamou muito bem desde a primeira oferta. Amamentando em livre demanda, sofri horrores no primeiro mês, peguei o jeito no segundo e no terceiro a vi se organizar para mamar a cada 2h, em média por 40min. Ciente de que o retorno às atividades do doutorado me imporiam limites na manutenção desse esquema, muito cedo comecei a me preocupar com a introdução alimentar. Quando a hora chegou, estrategicamente me cerquei de boas referências: fui para perto de minha mãe, que introduziu oito pessoas à vida alimentar, e da minha irmã com quem tenho mais sintonia, que tem três filhos e um pediatra que é também gastroenterologista. Assim, eu tive quem me auxiliasse na tarefa de preparação e oferta das primeiras refeições, juntamente com a sorte de receber as orientações de alguém de confiança e muito preocupado em fazer a coisa de um jeito respeitoso ao organisminho dos bebês.
Esse profissional é adepto da separação por grupos de alimentos, visando, ao mesmo tempo, oferecer variedade e respeitar o ritmo de funcionamento dos órgãos digestivos, principalmente os sensíveis intestinos. Ele me passou um esqueminha que ajuda a orientar como garantir a variedade e progressão de introdução das coisas mais difíceis de digerir. Uma coisa que é meio consenso é de que o oferecimento nunca deve envolver mamadeira, pelo simples fato de que ela é extremamente confortável pro bebê. Ou seja, acostumou com ela, vai se apegar e, muito, provavelmente, largar o peito, que demanda deles um esforço danado. Atentos a isso, usamos sempre a colher pros sólidos (tem vários modelos em silicone bem legais) e o copo pros líquidos (o primeiro foi comprado por minha mãe, pasmem, feito para se tomar cachaça, de um plástico molinho). Aos 7 meses oferecemos canudinho e ela sugou feliz da vida, tanto que é a maior “canudeira” até hoje.
Ela já estava com 10 meses quando aprendeu a usar uma caneca de transição que nos tem sido genial: ela tem alças, uma tampa com bico de silicone molinho e uma válvula de segurança que nem deixa derramar, nem deixa os restinhos babados voltarem pra dentro da caneca. A funcionalidade dela é tanta que quando a esquecemos em algum passeio, ficamos meio atrapalhados, especialmente se não há disponibilidade de canudo ou onde lavar bem a menininha, já que o uso do copo comum implica em maior sujeira. Fazemos uso dela sabendo que contraria as recomendações médicas, que são enfáticas quanto ao uso exclusivo de copos simples. Mas essa escolha entra no rol daquelas que fazemos assumindo os riscos da discordância pela conveniência que oferece ao cotidiano que vivemos, tal como foi com a escolarização aos 7 meses e o desmame precoce, aos 12.
A primeira coisa que oferecemos foi mamão, depois pera, em dias alternados e nesse meio tempo rolou também suco de laranja lima, que é menos ácida e mais doce. As papinhas salgadas fizemos conforme o esquema do pediatra, sempre amassadas no garfo e mantendo os vegetais separados. A finalidade é favorecer a mastigação e trabalhar o paladar pros diferentes sabores e texturas. Quando eu senti que ela já encarava, passei a oferecer pedacinhos e cedo ela demonstrou preferência por essa forma, tanto que permanece meio reticente a coisas pastosas, como purê de batata, por exemplo.
Eu demorei a entender que as papinhas salgadas não só podem como devem ser temperadinhas que nem comida de gente grande, e quando passei a temperar, ela aceitou ainda melhor, mesmo tendo estranhado as primeiras vezes, o que não só é considerado normal como sadio. Ela já comia há mais de um mês quando parei para ler com atenção a caderneta de vacinação e lá me deparei com o link para o site do programa do Ministério da Saúde sobre complementação alimentar. Lá, tivesse acesso ao pdf com receitas regionais de papinhas para a complementação alimentar, o que me ajudou muito com isso dos temperos e, mais ainda, com o cálculo das quantidades. Porque era um tal de falta papinha pra janta (ofertávamos o mesmo do almoço), sobra papinha pra mais três bebês, e eu vivia louca sem acertar as quantidades. Fora as vezes que me desliguei um pouco e ela comeu beterraba várias vezes na mesma semana e ficou avermelhada, como se tivesse tomado sol sem protetor...
Na orientação do pediatra, as fontes de glúten (trigo, aveia, cevada) deveriam ser oferecidas somente após os 8 meses, preferencialmente na versão integral, assim como as frutas muito ácidas (cupuaçu, por exemplo) e que prendem muito o intestino (açaí, goiaba), e foi o que fizemos. Para reduzir a produção de gases, os grãos eram mantidos primeiro num molho, cuja água era dispensada, e somente depois eram cozidos, para serem consumidos sempre no mesmo dia. Além disso, somente depois dela ter completado 1 ano foi que oferecemos alimentos com a clara de ovo e os derivados de leite, primeiro um queijo magro (aqui optamos pelo minas frescal) e depois iogurte natural, feito em casa, misturado somente com mel ou batidinho com frutas.
As poucas tentativas que fiz de oferecer mingaus foram frustradas e nunca envolveram leite de vaca (somente de soja e arroz), que ela até hoje só toma como ingrediente de alguma receita. Desde cedo oferecemos sucos variados, sempre com pouco açúcar, muitas vezes em combinações (abacaxi + hortelã ou gengibre, maracujá + manjericão, acerola + manga, manga + cardamomo, limão + couve). Em dias de temperaturas mais baixas, oferecemos também chás morninhos (cidreira, erva-doce, camomila). Dou preferência aos bolos e biscoitos feitos em casa, com farinha integral. E ofereço saladas cruas sempre temperadinhas com azeite, limão, ervas (secas e/ou frescas), pouco sal e sementes como de gergelim e mostarda.
Mesmo com a complementação, ela manteve o esquema de amamentação de 2h em 2h até os 8 meses, quando precisei escolarizá-la para poder cumprir com os compromissos do doutorado. Pouco antes dela completar o primeiro aninho, meu ritmo de trabalho somado com a amamentação noturna consumiram mais energia do que eu podia suportar, então conversei com o marido e as pediatras (contamos com a ajuda de uma homeopata e de uma alopata), e decidimos pelo desmame. Isso implicou no aumento do número de refeições diárias dela (de 4 para 6, depois para 7), o que fizemos gradualmente. Felizmente ela tolerou bem a mudança, permanecendo com um apego tão grande ao peito que, alguns meses depois, quando enfrentou um processo grave de adoecimento, voltou a mamar como se nada tivesse mudado. Até hoje, depois de mais de 1 ano de desmame, ela continua com verdadeira adoração ao peito e ainda pede para mamar vez por outra. E eu dou, feliz da vida.
Entre meus radicalismos, está a não oferta de várias coisas: biscoitos recheados, refrigerantes, embutidos, maionese, bebidas lácteas e achocolatados. Ela experimentou chocolate pela primeira vez ao completar 1 ano e depois disso em oportunidades tão poucas que contamos nos dedos das mãos. O mesmo vale para frituras, que jamais são feitas em casa. De vem quando, vamos a uma sorveteria na cidade onde os sorvetes são feitos artesanalmente, a partir de frutas frescas e sem gordura vegetal. Na pizzaria, que é raridade frequentarmos, escolhemos opções menos calóricas e oferecemos pequenas porções.
Um dos atrativos da escola escolhida foi a ajuda nesse sentido: são proibidos lanches muito artificiais e calóricos, ao invés de cantina tem cozinha, com cardápio feito por nutricionista, sem uso de açúcar branco (em casa usamos demerara para os sucos e mascavo para bolos e biscoitos), com boa variedade de vegetais e de receitas. Todos os dias ela leva fruta e somente fruta para o lanche, com tanta variedade quanto conseguimos manter (em geral, são 3 tipos).
Se foi fácil a introdução alimentar? Não. Impossível ser. Dá trabalho estar atenta à geladeira e à fruteira, calcular combinações, manter variedade, descascar, cortar, refogar, cozinhar. E ainda fugir dos agrotóxicos e adubos químicos, dos conservantes, corantes, espessantes, acidulantes e das pessoas querendo ser legais oferecendo toda a sorte (sorte?) de guloseimas supostamente saborosas. Mas, como eu disse no começo, isso de comer é algo que me encanta e fascina. Talvez por isso seja um trabalho a que me entreguei e entrego com esmero, dedicação e muita, muita satisfação. E certamente por isso que eu tenho uma criança que mastiga cookies de aveia com o mesmo prazer de bananas, sushis, tomates-cereja e cupcakes de limão.


E você? Como foi sua experiência com os alimentos do seu filho?